Transiberiano - Viagem ao Interior da Terra #1

 


- Vais fazer uma viagem ao interior da Terra?

- Vou!

- Qual é o itinerário?

- Rússia, Mongólia e China.

- Por que lhe chamas viagem ao interior da Terra?

- Porque entre Moscovo e Pequim não há oceanos, só existem rios, estamos mesmo no interior da Terra.

- Qual é o meio de transporte que apanhas?

- O célebre comboio Rossia, as pessoas conhecem-no por Transiberiano, a maior linha férrea do mundo. É uma linha tão grande que tem três ramais, centenas de estações e, milhares de quilómetros, imagina, quase 10.000 km.

- E tu vais percorrer os três ramais?

- Não, escolhi o ramal do Transmongoliano, os carris que me levarão à Mongólia e à China.

- Quais são as outras linhas férreas?

- O Transiberiano e o Transmanchuriano.

- Explica-nos, então, para onde nos podem levar estes comboios?

- O Transiberiano transporta o povo russo de S. Peterburgo a Vladivostok. Isto é, da cidade mais ocidental à cidade mais oriental da Rússia. Há 50 anos atrás só esta linha férrea ligava a Rússia de uma ponta a outra do território.

- Ah, então, vais optar pelo ramal do Transmanchuriano?

- Não, não. O Transmanchuriano vai só de Moscovo à fronteira chinesa. Este ramal não me interessa. Eu quero atravessar o deserto de Gobi, entrar na Mongólia Interior e descer em direcção a Pequim.

- Já percebi... queres mesmo ir até Pequim…

- Isso mesmo. Quero conhecer não só o maior país do mundo, a Rússia, como o mais populoso país da Terra, a China. E, como imaginas, não podemos deixar de visitar a Mongólia, o maior Império que alguma vez a História registou. O Império de Gengis Kan.

- De quantos dias vais precisar para fazer esta viagem?

- 20 dias: quatro para visitar Moscovo; quatro dias no comboio entre Moscovo e Irkutsk; dois dias para conhecer a capital da Sibéria Oriental, incluindo um passeio de barco no Baikal; dois de viagem entre Irkutsk e Ulaan Baatar, capital da Mongólia; dois dias para conhecer Ulaan Baatar; um dia e uma noite para a viagem entre a Mongólia e a China;

- quatro dias em Pequim;

Porque escolheste este calendário e não outro, já que o itinerário desta viagem tem um total de 50 paragens entre Moscovo e Pequim?

- Essa é justamente a grande questão da preparação do Transmongoliano. Num percurso onde, no total, o comboio faz 50 paragens, escolher as cidades, vilas, aldeias e localidades a visitar, é tarefa que depende, sobretudo, dos interesses e objectivos que animam o viajante. Aliás, podes fazer esta viagem durante toda a tua vida e, como imaginas, não ficarás a conhecer, por isso, a totalidade da Cultura e da História destes povos.  

A resolução do binómio tempo/interesse é a chave do sucesso para esta viagem. No meu caso, escolhi um tema histórico para fio condutor do itinerário: a História do Século XX.

Só neste trajecto, Moscovo - Pequim, consubstanciasse todo o pensamento político do século XX: o nascimento do Império comunista, a queda do nazismo, o maoismo e o conceito de guerra-fria.

- Ouvi dizer que a logística desta viagem é muito complicada. Disseram-me mesmo que era uma das viagens mais difíceis de organizar em torno da Terra. É verdade?

- Tens razão! Sabes, o homem ocidental quando pensa a geografia de um território, esquece-se das linhas que dividem as nações, das fronteiras politico –administrativas, da geografia de alma dos outros povos do mundo e, de facto, essa dinâmica de poder político, administrativo e territorial persegue o viajante ao longo de todo este itinerário.

Nós, europeus, já não estamos habituados a pedir licença para invadir a casa alheia.Os  europeus são cidadãos de um continente, reunidos em torno de valores e de uma cultura comum, em nome dos quais, movimentam-se, trabalham, trocam bens e serviços, livremente.

Neste lado do mundo, essa ideia não existe. Bem pelo contrário. Estes povos já estiveram unidos por um ideal, o ideal da internacional socialista, é verdade que nem todos a cantavam literalmente, a língua é sempre esse instrumento que nos obriga a palavras diferentes e com elas, a um dizer outro, mas, na verdade, russos, mongóis e chineses, mostram, nas fronteiras, o que pensam do seu lugar no mundo, e ainda, o que os seus povos querem para si da linguagem do mundo.

Repara, na prática, este itinerário, obriga-nos a atravessar, por terra, três países com fronteiras altamente restritivas, um deles, a Mongólia, antiga colónia soviética, mas, acresce a este facto, um outro, determinante, é que esta linha férrea é o centro nevrálgico de contrabando comercial entre estes três países.

- Porque decidiste escrever este livro?

  Porque o amor pode ser uma bela história. 

 

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