A gregária itinerante #1

Em Dezembro de 1973, depois de afixadas as notas do primeiro período, andava eu no antigo sétimo ano, Liceu D. Ana, em Lourenço Marques, Moçambique, o meu pai entendeu mandar-me estudar para a Europa, Portugal, Leiria, Colégio de Nossa Senhora do Rosário, na altura um dos internatos femininos mais exigentes, cuja responsabilidade educativa estava a cargo da comunidade alemã das irmãs dominicanas, determinado a tornar-me discípula da verdade, disciplina e lealdade.

Ora, tendo eu sido a terceira geração que nasceu em África, como se imagina, e com apenas 13 anos, o único país visitado por mim até então fora a África do Sul, Joanesburgo, onde viviam os médicos que acompanhavam a nossa família, nomeadamente, na especialidade de estomatologia.

Aterrei em Portugal no dia 4 de Janeiro de 1974, sozinha, tendo à minha espera no aeroporto uns primos afastados, conhecia-os mal, justamente de uma viagem que teriam feito a Moçambique, e porque eram da Metrópole, os meus pais trataram-nos com a deferência devida aos europeus, tendo eles acarinhado a criança que eu era, com a mentalidade correspondente ao tempo.

Nesse mesmo dia, bem cedo, levaram-me ao colégio onde era suporto entrar até às 16:00 de modo a ensaiar os hábitos e disciplina da casa. Nessa noite conheci as companheiras de camarata, fiz pela primeira vez a cama, coloquei a farda do colégio junto aos pés, para a vestir no dia seguinte o mais rapidamente possível, arrumei os toalheiros no banco, a irmã responsável do nosso andar apagou a luz às 21:30, e assim começou o mais longo aperto que o coração algum dia conheceu.

Outro continente, outro país, outra cidade, outros amigos. Verão - inverno, calções - saias, sandálias - botas, sol - chuva, claro - escuro, praia . campo, e tantas outras dissonâncias mais próprias dos adultos, que conheci criança.

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